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CICLO DE VIDA DA GESTÃO PÚBLICA: – Uma contribuição dos princípios da Boa Governança Pública na qualidade de vida do Gestor Público.

CICLO DE VIDA DA GESTÃO PÚBLICA: Uma contribuição dos princípios da Boa Governança Pública na qualidade de vida do Gestor Público.

RESUMO

Os cargos públicos são cobiçados e cercados de certo glamour, status, estabilidade e salários acima da média em algumas áreas, entre outros. Por estes motivos, são almejados por grande parte da população. Já os cargos de gestão pública têm uma cobiça ainda maior. Contudo, poucos estão preparados para entrar e sair com sua sanidade, como também agregar valor para a sociedade devido à falta de uma visão de Governança Corporativa. Neste sentido, o artigo visa conhecer o Ciclo de Vida da Gestão Pública, fazendo um paralelo com o Ciclo de Vida de um Produto, debatendo cada estágio e suas características, visando contribuir com uma visão de futuro para que os ocupantes desses cargos possam analisar e definir suas ações.

Palavras chave: Governança Pública, Mandato, Qualidade de Vida.

ABSTRACT

Public positions are coveted and surrounded by a certain glamor, status, stability and above average salaries in some areas, among others. For these reasons, they are targeted by a large part of the population. Public management positions, on the other hand, are even more greedy. However, few are prepared to enter and leave with their sanity and add value to society due to the lack of a Corporate Governance vision. In this sense, we will get to know the Life Cycle of Public Management making a parallel with the Life Cycle of a Product, discussing each stage and its characteristics in order to contribute with a vision of the future so that the occupants of these positions can analyze and define their actions.

Keywords: Public Governance, Mandate, Quality of Life.

I – INTRODUÇÃO

A falta de rumo ao iniciar a vida pública é um dos fatores que mais contribui para o fracasso da gestão. Ao receber a portaria o gestor público se vê à margem da falta de dados e informações de seus antecessores, dificultando a sua tomada de decisão. A Governança Corporativa ainda é muito incipiente, onde muitos gestores, ao perderem os cargos, preferem destruir as informações, bens e projetos. Indo de encontro a tudo que pregou e era pago pra fazer: agregar valor à sociedade. A dificuldade de entender o seu mandato e como ele pode ser dividido em estágios faz com que o tempo passe rápido demais, agravado pela falta de objetivos e metas.

Neste sentido, o conceito do Ciclo de Vida do Produto[2], que é amplamente utilizado como Ferramenta de Gestão no Marketing, pode contribuir para estruturar em etapas ou estágios, o período em que esteja à frente da gestão pública. Philip Kotler (2007, p. 244), faz uma referência da Ferramenta dividindo-a em 5 estágios: desenvolvimento e introdução, crescimento, maturidade e declínio. Enquanto outros autores, a exemplo de Las Casas (2001, p. 178)  que utilizam apenas 4 estágios, suprimindo o desenvolvimento, conforme abaixo:

Figura I – Ciclo de Vida do Produto.

Fonte: Adaptado pelo autor.

Os estágios de Desenvolvimento e Introdução foram unidos, tendo em vista que a Introdução inicia-se com o lançamento do produto. Cada estágio tem uma característica e uma forma de agir, podendo ser rápida ou durar vários anos. De acordo com o mercado consumidor ou um estágio de tempo planejado, conforme é possível observar na fala:

No desenrolar do ciclo de vida de um produto ou serviço, as exigências de marketing se alteram conforme as mudanças no comportamento de compra dos consumidores deslocam a vantagem competitiva resultante de um determinado alinhamento de estratégia e tática de marketing. (CESPEDES, 1996, p. 52)

Um grande exemplo é a empresa Coca-Cola, que está no mercado há mais de 100 anos, basicamente com o mesmo produto, sendo um líder de vendas, o segmento de moda, que descontínua seus produtos de acordo a estação do ano, criando ou recriando conceitos e tendências; outras mercadorias, no entanto, descobrem novas utilidades. Com a Gestão Pública não é diferente, como será exposto a seguir.

II – CONCEITOS DE GOVERNANÇA CORPORATIVA

Para uma melhor compreensão do tema Governança Corporativa é buscado na literatura subsídios para seu conceito, entre autores e instituições que tratam sobre o assunto.

A Governabilidade é o poder do Estado para governar, dada a sua legitimidade democrática e o apoio com que conta na população. Ela decorre da imagem institucional favorável junto à sociedade e da confiança que os cidadãos e outras partes interessadas depositam em sua atuação. A governabilidade de uma organização está relacionada à sua capacidade de assegurar condições sistêmicas e institucionais, para que a organização exerça sua missão, envolvendo a intermediação e o equilíbrio de interesses. Está, portanto, relacionada à atuação das diversas partes interessadas e à capacidade, especialmente dos integrantes do sistema de liderança, por meio da atuação da autoridade política, de forma a garantir o alcance dos objetivos institucionais e o atendimento ao interesse público.

O termo governança (governance) está relacionado com o pluralismo, visto que distintos atores têm o direito de influenciar a definição das políticas públicas. Assim, a governança diz respeito a uma alteração da função do Estado, tornando-se um instrumento para reforçar os mecanismos participativos de deliberação na esfera pública, na busca de atender às demandas da população. (MATIAS-PEREIRA, 2010, p. 30).

Governança Pública é o sistema que assegura às partes interessadas pertinentes ao governo estratégico das organizações públicas e o efetivo monitoramento da alta administração. A relação entre a questão pública e a gestão se dá por meio de práticas de medição, como auditorias independentes, unidades de avaliação, unidades de controle interno e externo, também por meio de instrumentos fundamentais para o exercício do controle. A Governança Pública assegura para as partes interessadas: equidade, transparência, responsabilidade pelos resultados com obediência aos princípios constitucionais e às políticas de consequência (Prêmio Qualidade Amazonas – PQA 2008).

Os princípios da Governança Corporativa são:

  1. Fairness (senso de justiça);
  2. Disclosure (transparência das informações);
  3. Accountability (prestação responsável de contas);
  4. Compliance (conformidade no cumprimento de normas reguladoras).

 

Entendem-se como posturas essenciais para a boa governança: a integridade ética, permeando todos os sistemas das relações internas e externas; o senso de justiça no atendimento das expectativas e demandas de todos os “constituintes organizacionais”; a exatidão na prestação de contas, fundamental para a confiabilidade da gestão; a conformidade com as instituições legais e com os marcos regulatórios; e a transparência, dentro dos limites em que a exposição dos objetivos estratégicos, dos projetos de alto impacto, das políticas e das operações das companhias não sejam conflitantes com as salvaguardas de seus interesses – pontos que deverão ser vistos com grande atenção (ANDRADE, 2007, p. 149).

Assim, é possível identificar a grande contribuição da Governança Pública para a entrega de resultados e resguardar a sobriedade do gestor público, por meio das ferramentas e mecanismos oferecidos pelo uso de seus princípios, aplicados ao Ciclo de Vida da Gestão Pública, conforme retratado a seguir.

III – CICLO DE VIDA DA GESTÃO PÚBLICA

É praticável dividir o Ciclo de Vida da Gestão Pública em 4 estágios. Para melhor exemplificação se é usado por base um mandato de 4 anos:

III. I – 1ª ESTÁGIO – A DESIGNAÇÃO:

O início de qualquer cargo público dar-se a partir da vigência da portaria[3]. Por meio desse momento, o cidadão está apto a assumir os ônus e os bônus da Gestão Pública. Tal estágio é caracterizado pela formação da equipe.

Devido ao apadrinhamento e acordos políticos, geralmente, neste estágio, a equipe é formada pelos amigos e apoiadores. Porém, com o tempo, o gestor público percebe que essas pessoas não contribuem com o afinco necessário e, muitas vezes, não querem fazer nada por ser “amigo do gestor”, sendo um estágio de poucos resultados, pois os indicados possuem pouca capacitação técnica, agravado pelo período anterior de três meses, onde o antigo gestor não se encontra motivado em implementar melhorias, mas sim em “arrumar” a casa para passar a gestão e evitar processos posteriores. Além disso, muitos resultados, documentos e equipamentos não são localizados, levando alguns meses iniciais para tomar pé da situação, sem contar a troca de sedes de secretarias e órgãos públicos.

Dentro do período de 4 anos, este estágio, geralmente, toma a maior parte do tempo, em torno de 2 anos, durando até a próxima eleição onde novos acordos são firmados. Dessa forma, tem início o 2ª Estágio.

III.II 2ª – ESTÁGIO – A GESTÃO TÉCNICA:

Este estágio é um dos momentos mais tensos, como também de grandes discórdias e descontentamentos. Assim como os amigos e apoiadores comumente não estão à altura do desafio que o cargo impõe, o gestor público se vê “forçado” a fazer mudanças no comando das pastas, convidando profissionais que podem contribuir mais devido ao seu conhecimento – os técnicos. Estes são pessoas que têm expertise em suas áreas de atuação, reestruturando suas equipes, dessa forma, elevando o nível e dando respostas aos desafios da gestão. No caso do Ciclo de Vida do Produto, o auge acontece no 3° estágio (maturidade), enquanto na gestão pública no 2° estágio.

Contudo, como já se passaram 2 anos no estágio anterior, este tem seu ciclo entre 1 ano e 1 ano e meio. A grande deficiência dos técnicos é que seu envolvimento político não é composto por grandes quantidades de seguidores, ou seja, de votos. Por esse motivo, com a proximidade da eleição, o gestor público, mais uma vez, encontra-se “forçado” a mudar a equipe, sucumbindo às pressões de possíveis aliados e amigos, seja trazendo os gestores do 1º estágio, seja formando a equipe com pessoas de novos acordos, iniciando, assim, o 3° estágio.

III.III – 3ª ESTÁGIO – O CABO ELEITORAL

Mesmo com a melhoria dos resultados, o gestor público não consegue vislumbrar uma vitória com a equipe do estágio anterior. Então, entre o 1° ano e 3 meses para o dia da eleição ele entra em um período de campanha, fazendo todo tipo de acordo, visando assegurar a renovação de sua portaria, incluindo a união com antigos rivais e inimigos, dos quais falou todo tipo de barbaridade e até ameaças.

É um estágio de poucas realizações. Porém, mascarado pelas “inaugurações” e resultados, sendo fruto do trabalho da equipe técnica anterior que geralmente não teve tempo hábil de concluir os trabalhos, devido à grande burocracia que o gestor público aguarda que dure até o próximo estágio. Este estágio permanece até o fatídico dia, o deadline, o momento em que se colocará em xeque todo o trabalho de sua gestão. O dia da eleição.

III – 4ª ESTÁGIO – O DIA DA ELEIÇÃO

O dia da eleição caracteriza o início e o fim do ciclo. Um possível argumento é que esse seria o dia da posse. Porém, na prática, o dia da eleição até o dia da posse representa o momento sombrio e obscuro da gestão pública. Caso seja uma reeleição, o gestor público dará continuidade ao próprio trabalho, renovando o ciclo no dia da posse. Caso seja derrotado nas urnas, serão 3 meses de continuidade do 3° estágio, ocorrendo de forma mais acentuada, totalmente apático aos desafios e anseios da sociedade. Segundo o filósofo Heráclito de Éfeso: “A única constante é a mudança”. Assim, só existe uma certeza para o gestor público: Vai sair! O cargo permanecerá através dos tempos e o gestor público deve trabalhar a sua ressignificação. Pois, sem a portaria, não mais estará à frente das atividades públicas. No entanto, a maioria não consegue desvincular-se e reencontrar seu papel na família, amigos e sociedade, sendo um estágio de grande adoecimento, depressão e vida centrada nos inimigos, uma vez que passará a vida perseguindo o seu sucessor.

O Ciclo de Vida da Gestão Pública tem grande relação com o Ciclo de vida do Produto, em estágio de que, mesmo sendo iniciada bem antes do período da candidatura ela se materializa com a emissão da portaria, conforme abaixo:

Figura 2 – Ciclo de Vida da Gestão Pública.

 

Fone: o autor

Cada ciclo tem as suas características e cabe ao gestor público analisar e definir quanto tempo deverá durar cada uma.

IV – CONSIDERAÇÕES FINAIS

É notório que, quando uma pessoa é contaminada pelo “vírus” da política é extremamente difícil deixar de participar como protagonista público. Para resguardar a sua sanidade, o gestor público deve trabalhar empenhado a evoluir ou migrar de cargo adiando sua saída. Contudo, por mais que seja seu esforço chegará o momento de passar o bastão, cabendo-lhe um trabalho mental prévio para que consiga conviver consigo mesmo e manter sua qualidade de vida. Um dos grandes desafios é que muitas pessoas – amigos, apoiadores e seus familiares – mantém seu estilo de vida e renda familiar alicerçado pelo desempenho do agente público, o que poderá comprometer e dificultar sua saída. Infelizmente, para alguns, apenas uma preocupação é realmente importante, pois definirá o recebimento ou renovação da sua portaria – o voto!

Portanto, para que o gestor possa fazer as entregas necessárias e ter uma boa qualidade de vida, a implantação e implementação da Boa Governança Pública é de grande importância, sendo também válida desde o primeiro dia do mandato, permeando todos os 4 estágios do Ciclo de Vida da Gestão Pública, o que será um grande diferencial em uma sociedade cada vez mais informada. Ter clareza dos objetivos e metas alicerçadas na conduta ética e nos princípios da Boa Governança Corporativa, acarretará como consequência uma maior tranquilidade, além de facilidade na condução da equipe, fazendo com que a tomada de decisão seja realizada por meio de dados e informações, dando as respostas que o âmbito social tanto espera e merece, oferecendo ao gestor público o maior de todos os prêmios: um bom legado na história.

REFERÊNCIAS

ANDRADE, Adriana. Governança Corporativa: fundamentos, desenvolvimento e tendências. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2007.

CESPEDES, Frank V. Marketing integrado: conjugando produto, vendas e serviços para ser mais competitivo / Frank V. Cespedes; tradução Eduardo Lasserre. São Paulo: Futura, 1996.

KOTLER, Philip. Princípios de Marketing / Philip Kotler e Gary Armstrong; Tradução Cristina Yamagami; revisão técnica Dilson Gabriel dos Santos.12. ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2007.

LAS CASAS, Alexandre Luzzi. Marketing: conceitos, exercícios, casos / Alexandre Luzzi Las Casas. 5. ed. São Paulo : Atlas, 2001.

MATIAS-PEREIRA, José. Governança no setor público. São Paulo: Atlas, 2010.

PRÊMIO QUALIDADE AMAZONAS, 2008, Manaus. Caderno de critérios […]. [S. l.: s. n.], 2008.

BRASIL. DECRETO – LEI Nº 11.638, DE 28 DE DEZEMBRO DE 2007. Altera e revoga dispositivos da Lei no 6.404, de 15 de dezembro de 1976, e da Lei no 6.385, de 7 de dezembro de 1976, e estende às sociedades de grande porte disposições relativas à elaboração e divulgação de demonstrações financeiras.

_____., Ministério da Cultura e Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos: Brasil: Um século de transformações. Org. Ignacy Sachs; Jorge Wilheim e Paulo Sérgio Pinheiro. São Paulo, Companhia das Letras, 2001.

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[1] Mestre em Gestão Pública pela UFPE (Universidade Federal de Pernambuco). Pós-graduado em Gestão de Pessoas e Marketing Estratégico pelo Centro Universitário de Volta Redonda (UniFOA). Possui graduação em Administração de Empresas pela Universidade Estadual de Alagoas (Uneal). Atualmente é Administrador de Empresas nos Correios em Alagoas onde atuou como Diretor Regional, Gerente de Operações, Vendas e Gestão de Pessoas. Diretor de Planejamento Estratégico da ABRH-AL. Tem experiência em consultoria na área de Administração, com ênfase em Gestão e Planejamento Estratégico, Recursos Humanos e Marketing Estratégico. Atua como professor em cursos de graduação e pós-graduação. Formação em Coach.

[2] O ciclo de vida se refere às fases que unem o interessado até a entrega do valor dos negócios, ocorrendo por todo o projeto.

[3] Para um melhor entendimento, juntamos as duas primeiras etapas no Ciclo de Vida do Produto, pois a Introdução inicia-se com o lançamento do produto e a Designação com a vigência da portaria.

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Revisado por: Laís Isabele.

Robson Nunes

Mestre em Gestão Pública pela UFPE, com foco em estratégias públicas. Pós-graduado em Gestão de Pessoas e Marketing Estratégico pelo Centro Universitário de Volta Redonda (UfiFOA). Possui graduação em ADMINISTRAÇÃO DE EMPRESAS pela Universidade Estadual de Alagoas. Sócio-Diretor do Instituto Edna Tizeu. Atuou como Diretor de Planejamento Estratégico da Associação Brasileira de Recursos Humanos – ABRH-AL. Tem experiência em consultoria na área de Administração, com ênfase em Gestão e Planejamento Estratégico, Recursos Humanos, Gestão de Projetos, entre outros. Blue Belt – Lean Manufacturing . Professor de graduação e pós-graduação. Formação em Coaching Multifocal pelo IMCC – Instituto Multifocal e formação internacional em Master Coaching, Mentoring e Holomentoring com foco Professional, Self & Life Coaching e Team, Leadership & Executive Coaching, pelo sistema ISOR do Instituto Holos.